O luto na infância

A morte acaba sendo sempre um fato inesperado que nos remete a sensação de impotência despertando muitas emoções e dificuldades. Na presença do falecimento de alguém, adultos costumam compartilhar de inúmeras dúvidas sobre qual postura adotar para comunicar a morte de uma pessoa ou animal de estimação para uma criança. A decisão tomada é sempre com a melhor das intenções tendo como objetivo principal amparar e poupar da dor e tristeza que envolve a perda, evitando um trauma de infância. Mas afinal, para a psicologia, qual a maneira mais indicada para abordar um tema tão delicado com uma criança? Alguns pontos devem ser sempre considerados quando o luto ocorre na infância.

1) Não prive a criança de ser consciente sobre a morte de alguém:

A maioria dos adultos tende a acreditar que pelas crianças serem novas e terem uma longa vida pela frente, não terão lembranças ou deixarão de sentir a ausência de alguém com facilidade, e isso não é verdade. Mesmo que possuam um repertório de memórias inferior à de um adulto, na infância se compartilha o luto da mesma maneira, havendo tristeza, angústia e saudades. O que a diferencia dos adultos é o fato de a criança não possuir tantos recursos e habilidades emocionais que a permitam nomear novas emoções, como as que são mobilizadas diante da perda de alguém principalmente ao se tratar de sua primeira experiência, portanto, privá-la da verdade contribui para que sejam vivenciadas intensas emoções sem oportunidade de nomeá-las ou esclarece-las.

2) Material lúdico:

Materiais lúdicos oferecem um grande auxílio para aprendizagem na infância sobre diversos assuntos, e ao se tornar necessário a abordagem da morte ou do luto, não poderia ser diferente.

Livros educativos e filmes com esta temática são um grande aliado para auxiliar a compreensão e significado da questão para criança dentro de seu repertório de compreensão.

3) Paciência com as perguntas que vem e vão:

Faz parte do desenvolvimento infantil a repetição de perguntas e nestes casos a paciência é fundamental. O fato de repetir questionamentos não tem relação com a criança não ter entendido a resposta obtida em seu último questionamento, mas sim com o fato de revisitar e reinterpretar memórias a partir de novos pontos de vistas conforme seu amadurecimento.

Esta é a forma que ela encontra para aprofundar o conhecimento sobre o mundo e sobre si mesma, tornando dúvidas não apenas frequentes como recorrentes. Quando questões sobre a morte ou falecimento de alguém ressurgirem, é importante que antes de responder, seja questionado a motivação da pergunta, possibilitando que você responda do ponto em que o pensamento de dúvida da criança se encontra evitando informações complexas ou respostas que ampliarão suas dúvidas ao invés de esclarece-las.

O luto na infância

4) Prevenção de fantasias:

Dentre tantas possibilidades de possíveis mentiras que você pode contar a uma criança, escolher a verdade é consenso para os profissionais da área. Com intenção de poupá-las da tristeza ou sofrimento, os adultos optam muitas vezes por contar mentiras, temendo gerar traumas de infância.

Inicialmente, vale ressaltar que crianças possuem um grande potencial criativo, estando propensas a cultivar fantasias que nestes casos mobilizam sentimento de culpa. Por exemplo, ao sentir ciúmes da possibilidade de ganhar um irmão e o bebê não retornar da maternidade por ter falecido, a criança pode fantasiar que a morte do irmão foi efeito de seu ciúmes, ou então, ao dizer para uma criança que um familiar foi viajar e este, nunca retornar ou não ter se despedido, pode contribuir para fantasias de abandono. Outra questão que vale enfatizar sobre mentiras, é que uma vez descoberta, o vínculo de confiança naquele adulto é ferido, privando a rede de apoio e confiança que a criança possui para dividir dúvidas e angústias.

5) Educação:

De maneira geral, independente de crenças ou religiões, a morte faz parte do ciclo da vida e por questões culturais, não é um tema abordado com frequência entre crianças. Considerando de que seria inevitável não ser exposto a morte em algum momento da vida, inserir o tema em casa e até mesmo nas escolas, torna-se saudável ao preparar a criança emocionalmente para lidar com estes momentos difíceis. Além do material lúdico como livros e filmes, o convívio com animais de estimação ou cultivo de plantas insere de maneira sutil a temática da morte dentro da realidade da criança como uma etapa do ciclo da vida de qualquer ser vivo.

6) Emoções:

Se torna mais fácil para criança nomear suas emoções se você compartilha delas. Ao sentir-se enlutada e receber informações dos adultos próximos confirmações de emoções contrárias as que está sentindo, entende que algo diferente está acontecendo com ela por imaginar não estar conseguindo lidar com o fato da maneira correta. É importante lembrar que o luto diante da perda de alguém é compartilhado por todos os envolvidos e, compartilhar emoções favorece a compreensão das crianças além de fortalecer o vínculo familiar no momento de perda.

O luto na infância

7) Tempo e metáforas:

Dentro dos recursos presentes nas etapas de desenvolvimento da infância, é importante informar à criança que ela não verá mais aquela pessoa para contribuir na aquisição de noção de tempo e para isso, evitar metáforas por serem de difícil compreensão é importante. Por exemplo, ao dizer que reencontrará um familiar apenas quando ela morrer, o desejo de sua própria morte pode ser despertado em um momento intenso de saudades. Se for o caso, revelar que esperamos que apenas pessoas bem velhinhas morram, mas que isso pode acontecer com pessoas mais jovens e até mesmo crianças em casos de doenças incuráveis (nomeando que se restringem a casos de doenças muito graves para que ela não suponha que qualquer doença poderá leva-la a morte) auxiliam na compreensão do significado da perda.

8) Velórios:

É possível crianças irem a velórios. O velório é uma cerimônia que possibilita a despedida e homenagem, e se despedir ou homenagear pode ser um desejo da criança. O indicado é não determinar sua presença ou ausência, mas possibilitar que ela mesma escolha a partir de sua orientação sobre como será a cerimônia, que tipo de comportamento ela deverá ter, quanto tempo costuma durar, se ela poderá receber atenção no local ou não, etc. No caso dela optar por ir, todas estas informações e orientações prévias vão ajudá-la a lidar com esta nova experiência.

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Maitê Hammoud
maitehammoud@hotmail.com